Jean Schuster
(1929
– 1995)
Introdução
Sobre o autor: nasceu em
Paris, França. Aderiu ao surrealismo aos 19 anos, tornando-se elemento
importante do movimento e colaborando em todas suas publicações de 1948 a 1960.
Este texto pertence ao livro Surrealismo e Novo Mundo, que a
princípio fora um evento internacional, organizado na Argentina, em outubro e
novembro de 1992, dedicado à memória do poeta Aldo Pellegrine (1903-1973), que
foi pioneiro do surrealismo latino-americano, fundador da primeira revista surrealista de língua castelhana, espinha
dorsal do surgimento, fortalecimento, e papel referencial do grupo surrealista
argentino.
Por se
tratar de um tema vasto e complexo, procurei me deter ao título e as artes plásticas ,
destacando o que realmente importa para
o assunto abordado.
É preciso saber em primeiro lugar o que significa a palavra Diáspora, e qual a definição de Surrealismo?
Diáspora:
É a dispersão de povos por motivos políticos ou religiosos, em virtude de
perseguição de grupos dominadores intolerantes.(Dicionário Aurélio)
Breton
define o Surrealismo : “Automatismo psíquico pelo qual alguém se
propõe a exprimir, seja verbalmente,
seja por escrito, seja de qualquer outra maneira, o funcionamento real do
pensamento; é o ditado do pensamento com a ausência de todo controle
exercido pela razão, além de toda e
qualquer preocupação estética e moral ”. (trecho retirado do manifesto
surrealista)
Contudo
, o surrealismo não se reduz ao automatismo, este é só um método ( o qual o
próprio Breton passa a considerar insuficiente). O Surrealismo é uma concepção
total do ser humano e suas relações com o mundo, a libertação do ser e sua
consciência das pressões que se divide em razão e sonho, é acima de tudo, uma
atitude espiritual que pode manifestar-se de variadas formas, expressando as
imagens da realidade mais profunda do ser humano – o subconsciente.
Em
segundo lugar é preciso saber ( Por
que, Como, Quando e Onde aconteceu?)
Aspectos
relevantes para sua origem:
-
O Dadaísmo : que “encontrava a sua liberdade na prática constante da negação; e o
surrealismo procura dar o fundamento de uma “doutrina” a essa liberdade. É a
passagem da negação à afirmação.”( Michelin, 2004, p.151)
-
“
da repulsa sentida diante da carnificina de 1914-1918, quando as diferentes
potências européias se digladiavam por interesses econômicos e por questões de
prestígio.” (Schuster, p.110) Com a crise ainda aberta ,
criando fraturas entre arte e sociedade, entre mundo interior e exterior, entre
realidade e fantasia, os surrealistas buscavam encontrar um meio termo entre os
dois lados , um ponto de coincidência que
pudesse remediar as lacerações da crise, aí se encontra o elemento
original deste movimento.
“Assim, o problema da liberdade continua sendo o problema
fundamental do surrealismo. Da mesma forma que dadá, portanto, ele também não
se apresenta como uma escola literária ou artística. O mote de Rimbaud, “a
literatura é uma idiotice”, também é a sua palavra de ordem: o que está em jogo
é muito mais importante do que a arte de fazer quadros ou de escrever versos,
está em jogo o destino do homem, seu sucesso ou sua ruína na Terra. É isso que
o surrealismo entende e é justamente na direção dessa verdade sem subentendidos
que tem início a sua ação. “(Michelin, p.152)
-
A pintura metafísica de um pintor chamado
Giorgio De Chirico ( 1888 – 1979): explorava os aspectos oníricos (que serão
desenvolvidos pelos surrealistas).
Breton
em seu livro “O surrealismo e a pintura”,
coloca De Chirico à frente dos artistas desse movimento, neste mesmo livro
apresenta um texto onde o artista De Chirico expressa suas idéias:
“ Para que uma obra de arte seja verdadeiramente imortal” ,
lê-se entre outras coisas, “é necessário que saia completamente dos limites do humano; o bom
senso e a lógica a danificam. Dessa maneira, ela se aproximará do sonho e da
mentalidade infantil. A obra profunda
será impulsionada pelo artista para as profundezas mais recônditas do seu ser:
ali não chega o sussurrar dos riachos, o canto dos pássaros, o murmúrio das
folhas. O que eu ouço nada vale, apenas meus olhos enxergam, abertos e , mais
ainda, fechados. O que importa,
sobretudo, é livrar a arte daquilo que ela contém de conhecido até hoje; cada
idéia, cada símbolo deve ser posto de lado. “É preciso ter uma grande confiança
em si mesmo; é preciso que a revelação
que temos de uma obra de arte, que a
concepção de um quadro que reproduz a tal coisa sem sentido algum por si só,
sem sujeito, sem significado do ponto de vista da lógica humana; é preciso,
dizia, que semelhante revelação ou concepção seja tão forte em nós, nos
proporcione uma alegria tão grande, ou uma dor tão grande, que nos sintamos
obrigados a pintar impulsionados por uma força maior do que a que leva um
esfomeado a morder como um animal o pedaço de pão que lhe cai nas mãos.” De Chirico, 1914. (ibidem, p.165 e 166)
Considerado
pelos historiadores, como o último movimento de vanguarda, respondia à pergunta
feita pelos intelectuais de toda Europa:
_ Como sair da angústia da crise?
“Transformar o mundo” (Marx) , “Mudar a vida”
(Rimbaud) essas duas palavras de ordem são para nós uma coisa só”
André
Breton.
Poderíamos dizer que o surrealismo teve
início em 1919, quando André Breton e Philippe Soupault publicam “Os campos
magnéticos”, primeira coletânea de textos automáticos. (ibidem,
p.41 e 42)
Porém,
historicamente possui como marco , a
publicação do Manifesto Surrealista em
outubro de 1924; inicialmente o grupo era composto por: Louis Aragon (escritor
francês), André Breton (poeta e psiquiatra), Benjamin Péret(poeta) e Philippe Soupault(escritor).
Possuía quatro critérios
fundamentais:
Atividade coletiva, duradoura, ligada à história contemporânea e isenta de preocupação proselitista (
conversão de doutrina).
Segundo
o autor , o surrealismo existiu verdadeiramente na Bélgica, e em Paris onde
particularmente ocorreu o chamado de “a internacional surrealista”, pois
encontravam-se artistas de vários
países. como
“os alemães Ernest e Bellmer, o austríaco
Paalen, os romenos Tzara, Brauner, Hérold e Trost, o norte –americano Man Ray,
os cubanos Wifredo Lam e Camacho, os canadenses Benoit e Mimi Parent, os
espanhóis Dalí, Buñel e Dominguez, o mexicano Octavio Paz, os tchecos Heisler e
Toyen, etc.”(Schuster, p. 108)
No
período da Segunda Guerra Mundial, Nova Iorque, Londres e México tornaram-se
centros autênticos de atividades surrealistas, ligados a um firme antinazismo.
A
diáspora surrealista possuía a vontade
de substituir o estatuto do artista
individual por um pensamento comum.
Um
norte-americano antinazista, Varian Fry cria o Centro Americano de Socorros e
aluga uma casa em Marselha, no ano de 1940, para acolher pessoas ameaçadas, a
casa Air-Bel como assim era chamada, abrigou vários artistas, como Breton,
Domínguez, Ernest, Hérold, Lam, Masson, Péret, Victor Serge, e outros que
aguardavam uma partida para uma terra
menos inóspita.
Em Nova
Iorque, em 1942 Breton junto com Marcel Duchamp, organizam a quinta exposição
internacional surrealista, First papers
of surrealism. (a quarta ocorreu no México, organizada por Wolfgang Paalen
e peruano César Moro).
Os
artistas que participaram : Roberto Matta, Yves Tanguy, Max Ernst, Marc Chagal,
Fernand Léger, André Breton, Piet Mondrian, André Masson, Amédée Ozenfant,
Jacques Lipchitz, Pavel tchelitchew, Kurt Seligmann e Eugene Berman.
Além de
eventos relacionados as artes plásticas, ocorreram também na literatura, onde
foram publicadas várias revistas e artigos, como as revistas La Main à Plum (1942, em Paris ) e,
a Dyn
( abril – maio de 1942, no México) e a VVV ( 03 números – de junho de 1942
à fevereiro de 1944, em Nova Iorque) ,
“No
entanto,a imagem mais fiel da diáspora surrealista foi a publicação, em Nova
Iorque, em 1943, de um estudo de Benjamin Péret consagrado aos mitos e às
lendas dos índios da América e intitulado – sem dúvida nenhuma devido à
instigação de Breton – A palavra está
com Péret. Permito-me concluir esta rápida panorâmica do surrealismo
durante os anos 40 lendo a apresentação desse texto, assinado por 24 amigos do
poeta, dispersos em dez países. Símbolo da separação, é também um símbolo da
profunda unidade do surrealismo, além das fronteiras e dos oceanos
A
importância do texto abaixo _ destinado, em sua tradução inglesa, a servir de
introdução a uma coletânea de mitos, lendas e contos populares da América –
pareceu, aos amigos do autor, grande o suficiente para justificar que
tomassem a iniciativa de publicá-lo isolada e antecipadamente na língua
original. Impregnados de seu rigor e de
seu ardor, cujo jogo combinado aparenta-o com um reduzido número de obras
teóricas extremamente eficazes e lhe empresta
uma ressonância quase única nos tempos que atravessamos, eles declaram
assumir todas as suas conclusões. Em homenagem, aqui, a Benjamin Péret,
acreditam poder associar aos seus próprios nomes aqueles dos ausentes cuja
atitude anterior implica a mesma solidariedade atual que a sua relação a um
espírito de uma liberdade inalterável, que uma vida singularmente isenta de
concessões nunca deixou de respaldar.
Nova
Iorque, 18 de maio de 1943.
André
Breton, Marcel Duchamp, Charles Duits, Max Ernst, Matta, Yves Tanguy [assinam ]
por J.B. Brunius, Valentine Pensore (Inglaterra), René Magrite, Paul Nougé,
Raoul Ubac (Bélgica), Braulio Arenas, Jorge Cáceres (Chile), Wilfredo
Lam(Cuba), Georges Henein (Egito), Victor Brauner, Oscar Domínguez, Jacques
hérold (França), Pierre Mabille (Haiti), Aimé Césaire, Suzanne Césaire, René Ménil
(Martinica), Leonora carrington, Esteban francés (México). (ibidem, p.114)
O
vínculo entre o surrealismo europeu e os artistas latino-americanos possuiu um
personagem principal, o artista chileno, Roberto Matta. Em sua pintura utilizou
do automatismo e as paisagens imaginárias, com as superposições de manchas
translúcidas , realizadas espontaneamente, com cores vibrantes; através de suas
obras os artistas norte-americanos conheceram
as possibilidades do automatismo que derivou na pintura de ação (dripping), técnica
característica nas obras de Jackson
Pollock.
Na
América Latina em particular, o surrealismo era formado por grupos de pessoas
do lugar e refugiados da Europa, como Paalen, Alice Rahon, Péret, Remedios Varo
e Leonora Carrington, muitos estabeleceram residência no México.
Sem o
asilo das Américas durante a segunda guerra, poderíamos dizer que o movimento
terminaria em 1939, pois tomemos alguns exemplos que comprovam esta afirmação:
o poema de Breton, chamado Fata Morgana
( censurado na França) fora publicado em 1942, na capital da Argentina, (Buenos
Aires) graças a Roger Caillois; e
lembrar que na mesma Argentina nasce o primeiro grupo surrealista da
América Latina, em 1926; que no Chile, em 1938, jovens poetas aderem ao movimento com um manifesto.
Conclusão
O
assunto Surrealismo já é fascinante,
pois mexe com a fantasia da realidade, o imaginário do inconsciente, vê-lo por
este lado mais atormentado pela guerra , me causou um grande impacto, pois não
tinha noção da sua importância neste período da história, as pessoas
se sentiam perdidas e desoladas com o que estava acontecendo, esta união através da arte buscava forças para
continuarem a lutar e ir em frente, acho
que não dá para se ter realmente uma
conclusão sobre os fatos ocorridos nesta época, pois a distância e a ausência de se viver uma guerra, nos
deixa muito aquém do que verdadeiramente aconteceu.
Bibliografia
ADES,
Dawn, Arte na América Latina. Cosac
& Naify; SP, 1997.
MICHELI,
Mario de, As vanguardas Artísticas. Ed.
Martins Fontes: SP , 2004.
PONGE,
Robert (org), Surrealismo e o Novo Mundo.
Ed. Universidade/UFRGS : Porto Alegre – RS , 1999.