Seja um seguidor(a), não custa nada!

segunda-feira, 22 de julho de 2013

A Diáspora Surrealista na América durante a Segunda Guerra Mundial

Jean Schuster
(1929 – 1995)

Introdução
Sobre o autor: nasceu em Paris, França. Aderiu ao surrealismo aos 19 anos, tornando-se elemento importante do movimento e colaborando em todas suas publicações de 1948 a 1960.

Este texto pertence ao livro Surrealismo e Novo Mundo, que a princípio fora um evento internacional, organizado na Argentina, em outubro e novembro de 1992, dedicado à memória do poeta Aldo Pellegrine (1903-1973), que foi pioneiro do surrealismo latino-americano, fundador da primeira revista  surrealista de língua castelhana, espinha dorsal do surgimento, fortalecimento, e papel referencial do grupo surrealista argentino.

Por se tratar de um tema vasto e complexo, procurei  me deter ao título e as artes plásticas , destacando o que realmente  importa para o assunto abordado.

É  preciso saber em primeiro lugar  o que significa a  palavra Diáspora,  e qual a definição de Surrealismo?
Diáspora: É a dispersão de povos por motivos políticos ou religiosos, em virtude de perseguição de grupos dominadores intolerantes.(Dicionário Aurélio)

Breton define o Surrealismo : “Automatismo psíquico pelo qual alguém se propõe a exprimir, seja  verbalmente, seja por escrito, seja de qualquer outra maneira, o funcionamento real do pensamento; é o ditado do pensamento com a ausência de todo controle exercido  pela razão, além de toda e qualquer preocupação estética e moral ”. (trecho retirado do manifesto surrealista)
Contudo , o surrealismo não se reduz ao automatismo, este é só um método ( o qual o próprio Breton passa a considerar insuficiente). O Surrealismo é uma concepção total do ser humano e suas relações com o mundo, a libertação do ser e sua consciência das pressões que se divide em razão e sonho, é acima de tudo, uma atitude espiritual que pode manifestar-se de variadas formas, expressando as imagens da realidade mais profunda do ser humano – o subconsciente.

Em segundo lugar é preciso saber (  Por que,  Como, Quando e Onde aconteceu?)
Aspectos relevantes para sua origem:
-          O Dadaísmo : que “encontrava a sua liberdade na prática constante da negação; e o surrealismo procura dar o fundamento de uma “doutrina” a essa liberdade. É a passagem da negação à afirmação.”( Michelin, 2004, p.151)
-          “ da repulsa sentida diante da carnificina de 1914-1918, quando as diferentes potências européias se digladiavam por interesses econômicos e por questões de prestígio.” (Schuster, p.110) Com a crise ainda aberta , criando fraturas entre arte e sociedade, entre mundo interior e exterior, entre realidade e fantasia, os surrealistas buscavam encontrar um meio termo entre os dois lados , um ponto de coincidência que  pudesse remediar as lacerações da crise, aí se encontra o elemento original deste movimento.
“Assim, o problema da liberdade continua sendo o problema fundamental do surrealismo. Da mesma forma que dadá, portanto, ele também não se apresenta como uma escola literária ou artística. O mote de Rimbaud, “a literatura é uma idiotice”, também é a sua palavra de ordem: o que está em jogo é muito mais importante do que a arte de fazer quadros ou de escrever versos, está em jogo o destino do homem, seu sucesso ou sua ruína na Terra. É isso que o surrealismo entende e é justamente na direção dessa verdade sem subentendidos que tem início a sua ação. “(Michelin, p.152)

-          A pintura metafísica de um pintor chamado Giorgio De Chirico ( 1888 – 1979): explorava os aspectos oníricos (que serão desenvolvidos pelos surrealistas).
Breton em seu livro “O surrealismo e a pintura”, coloca De Chirico à frente dos artistas desse movimento, neste mesmo livro apresenta um texto onde o artista De Chirico expressa suas idéias:
“ Para que uma obra de arte seja verdadeiramente imortal” , lê-se entre outras coisas, “é necessário que saia  completamente dos limites do humano; o bom senso e a lógica a danificam. Dessa maneira, ela se aproximará do sonho e da mentalidade infantil. A obra  profunda será impulsionada pelo artista para as profundezas mais recônditas do seu ser: ali não chega o sussurrar dos riachos, o canto dos pássaros, o murmúrio das folhas. O que eu ouço nada vale, apenas meus olhos enxergam, abertos e , mais ainda,  fechados. O que importa, sobretudo, é livrar a arte daquilo que ela contém de conhecido até hoje; cada idéia, cada símbolo deve ser posto de lado. “É preciso ter uma grande confiança em si mesmo; é  preciso que a revelação que temos de uma obra de arte, que  a concepção de um quadro que reproduz a tal coisa sem sentido algum por si só, sem sujeito, sem significado do ponto de vista da lógica humana; é preciso, dizia, que semelhante revelação ou concepção seja tão forte em nós, nos proporcione uma alegria tão grande, ou uma dor tão grande, que nos sintamos obrigados a pintar impulsionados por uma força maior do que a que leva um esfomeado a morder como um animal o pedaço de pão que lhe cai nas mãos.”  De Chirico, 1914.    (ibidem, p.165 e 166) 

Considerado pelos historiadores, como o último movimento de vanguarda, respondia à pergunta feita pelos intelectuais de toda Europa:  _ Como sair da angústia da crise?
 “Transformar o mundo” (Marx) , “Mudar a vida” (Rimbaud) essas duas palavras de ordem são para nós uma coisa só”        
                             André Breton.

Poderíamos dizer que o surrealismo teve início em 1919, quando André Breton e Philippe Soupault publicam “Os campos magnéticos”, primeira coletânea de textos automáticos. (ibidem, p.41 e 42)

Porém, historicamente possui como  marco , a publicação do Manifesto Surrealista em  outubro de 1924; inicialmente o grupo era  composto por: Louis Aragon (escritor francês), André Breton (poeta e psiquiatra), Benjamin Péret(poeta)  e Philippe Soupault(escritor).

Possuía quatro critérios fundamentais:
Atividade coletiva, duradoura, ligada à história contemporânea e  isenta de preocupação proselitista ( conversão de doutrina).

Segundo o autor , o surrealismo existiu verdadeiramente na Bélgica, e em Paris onde particularmente  ocorreu o  chamado de “a internacional surrealista”, pois  encontravam-se  artistas de vários países. como
os alemães Ernest e Bellmer, o austríaco Paalen, os romenos Tzara, Brauner, Hérold e Trost, o norte –americano Man Ray, os cubanos Wifredo Lam e Camacho, os canadenses Benoit e Mimi Parent, os espanhóis Dalí, Buñel e Dominguez, o mexicano Octavio Paz, os tchecos Heisler e Toyen, etc.”(Schuster, p. 108)

No período da Segunda Guerra Mundial, Nova Iorque, Londres e México tornaram-se centros autênticos de atividades surrealistas, ligados a um firme antinazismo.

A diáspora surrealista  possuía a vontade de substituir o estatuto do artista  individual por um pensamento comum.

Um norte-americano antinazista, Varian Fry cria o Centro Americano de Socorros e aluga uma casa em Marselha, no ano de 1940, para acolher pessoas ameaçadas, a casa Air-Bel como assim era chamada, abrigou vários artistas, como Breton, Domínguez, Ernest, Hérold, Lam, Masson, Péret, Victor Serge, e outros que aguardavam  uma partida para uma terra menos inóspita.
Em Nova Iorque, em 1942 Breton junto com Marcel Duchamp, organizam a quinta exposição internacional surrealista, First papers of surrealism. (a quarta ocorreu no México, organizada por Wolfgang Paalen e  peruano César Moro).
Os artistas que participaram : Roberto Matta, Yves Tanguy, Max Ernst, Marc Chagal, Fernand Léger, André Breton, Piet Mondrian, André Masson, Amédée Ozenfant, Jacques Lipchitz, Pavel tchelitchew, Kurt Seligmann e Eugene Berman.

Além de eventos relacionados as artes plásticas, ocorreram também na literatura, onde foram publicadas várias revistas e artigos, como as revistas  La Main à Plum (1942, em Paris ) e, a  Dyn  ( abril – maio de 1942, no México) e a VVV ( 03 números – de junho de 1942  à fevereiro de 1944, em Nova Iorque) ,
“No entanto,a imagem mais fiel da diáspora surrealista foi a publicação, em Nova Iorque, em 1943, de um estudo de Benjamin Péret consagrado aos mitos e às lendas dos índios da América e intitulado – sem dúvida nenhuma devido à instigação de Breton – A palavra está com Péret. Permito-me concluir esta rápida panorâmica do surrealismo durante os anos 40 lendo a apresentação desse texto, assinado por 24 amigos do poeta, dispersos em dez países. Símbolo da separação, é também um símbolo da profunda unidade do surrealismo, além das fronteiras e dos oceanos
A importância do texto abaixo _ destinado, em sua tradução inglesa, a servir de introdução a uma coletânea de mitos, lendas e contos populares da América – pareceu,  aos amigos do autor,  grande o suficiente para justificar que tomassem a iniciativa de publicá-lo isolada e antecipadamente na língua original. Impregnados  de seu rigor e de seu ardor, cujo jogo combinado aparenta-o com um reduzido número de obras teóricas extremamente eficazes e lhe empresta  uma ressonância quase única nos tempos que atravessamos, eles declaram assumir todas as suas conclusões. Em homenagem, aqui, a Benjamin Péret, acreditam poder associar aos seus próprios nomes aqueles dos ausentes cuja atitude anterior implica a mesma solidariedade atual que a sua relação a um espírito de uma liberdade inalterável, que uma vida singularmente isenta de concessões nunca deixou de respaldar.
Nova Iorque, 18 de maio de 1943.
André Breton, Marcel Duchamp, Charles Duits, Max Ernst, Matta, Yves Tanguy [assinam ] por J.B. Brunius, Valentine Pensore (Inglaterra), René Magrite, Paul Nougé, Raoul Ubac (Bélgica), Braulio Arenas, Jorge Cáceres (Chile), Wilfredo Lam(Cuba), Georges Henein (Egito), Victor Brauner, Oscar Domínguez, Jacques hérold (França), Pierre Mabille (Haiti), Aimé Césaire, Suzanne Césaire, René Ménil (Martinica), Leonora carrington, Esteban francés (México). (ibidem, p.114)

O vínculo entre o surrealismo europeu e os artistas latino-americanos possuiu um personagem principal, o artista chileno, Roberto Matta. Em sua pintura utilizou do automatismo e as paisagens imaginárias, com as superposições de manchas translúcidas , realizadas espontaneamente, com cores vibrantes; através de suas obras os artistas norte-americanos conheceram  as possibilidades do automatismo que derivou  na pintura de ação (dripping), técnica característica nas obras de  Jackson Pollock.
Na América Latina em particular, o surrealismo era formado por grupos de pessoas do lugar e refugiados da Europa, como Paalen, Alice Rahon, Péret, Remedios Varo e Leonora Carrington, muitos estabeleceram residência no México.

Sem o asilo das Américas durante a segunda guerra, poderíamos dizer que o movimento terminaria em 1939, pois tomemos alguns exemplos que comprovam esta afirmação: o poema de Breton, chamado Fata Morgana ( censurado na França) fora publicado em 1942, na capital da Argentina, (Buenos Aires) graças a Roger Caillois; e  lembrar que na mesma Argentina nasce o primeiro grupo surrealista da América Latina, em 1926; que no Chile, em 1938, jovens  poetas aderem ao movimento com um manifesto.

Conclusão
O assunto Surrealismo já é fascinante, pois mexe com a fantasia da realidade, o imaginário do inconsciente, vê-lo por este lado mais atormentado pela guerra , me causou um grande impacto, pois não tinha noção da sua importância neste período da história,   as pessoas  se sentiam perdidas e desoladas com o que estava acontecendo,  esta união através da arte buscava forças para continuarem a lutar e ir  em frente, acho que  não dá para se ter realmente uma conclusão sobre os fatos ocorridos nesta época, pois a distância  e a ausência de se viver uma guerra, nos deixa muito aquém do que verdadeiramente aconteceu.

Bibliografia
ADES, Dawn, Arte na América Latina. Cosac & Naify; SP, 1997.

MICHELI, Mario de, As vanguardas Artísticas. Ed. Martins Fontes: SP , 2004.

PONGE, Robert (org), Surrealismo e o Novo Mundo. Ed. Universidade/UFRGS : Porto Alegre – RS , 1999.


Nenhum comentário:

Postar um comentário